
Queimar livros em praça pública: já vimos isso antes, não? Mas nazistas são sempre os outros. 313x1c
Enquanto isso, no Brasil, o livro infantil “Abecê da liberdade - A história de Luiz Gama", de José Roberto Torero e Marcus Aurelius Pimenta, com ilustrações de Edu Oliveira, não foi queimado em praça pública, mas foi sumariamente recolhido das livrarias porque... uma leitora se sentiu ofendida.
"Abecê da liberdade", queconta a infância do escritor e advogado Luiz Gama, importante figura da luta abolicionista no Brasil, inclui a página abaixo:
“Abecê da liberdade” já foi editado e reeditado várias vezes, sem que nenhum leitor ficasse chocado. E parece claro que a intenção dos autores não foi ofender ninguém. É evidente que qualquer um tem o direito de não gostar, ou de achar que eles erraram no tom, neste como em qualquer outro livro.
Mas a interpretação de um leitor é justificativa suficiente para retirar um livro de circulação? Atualmente é.
Se continuarmos nesse caminho, em breve vão ter que proibir e retirar de circulação muitas outras obras, incluindo quase todos os clássicos da literatura e do cinema. Já está acontecendo: basta lembrar os ataques recorrentes a Monteiro Lobato e a recente censura ao filme “...E o vento levou”, por sua violência simbólica.
E não adiantou Torero explicar que se trata de uma obra de ficção, nem argumentar que: “Se as crianças não soubessem o que ia acontecer [na escravidão], talvez elas brincassem. Crianças brincam em velórios, por exemplo. É uma forma de fugir da dor”.
Imediatamente foram convocados acadêmicos para emitir julgamentos indignados sobre o livro e referendar a sentença: censurado. A editora acatou a ordem do tribunal da internet e mandou recolher, divulgando uma nota com o trecho: “Assumimos nossa falha nesse processo e estamos em conversa com os autores para a devida revisão do livro. Esta edição está fora de mercado e não voltará a ser comercializada”.
É a censura do bem.
Curiosamente, a leitora que se sentiu chocada com “Abecê da liberdade” declarou: "Foi uma surpresa e um choque ler a cena das crianças brincando de ciranda dentro do navio negreiro. Eu fiquei me perguntando se aria pela cabeça de alguém fazer a mesma cena com crianças em Auschwitz, sabe? Iam achar bonitinho as crianças brincando de ciranda antes de entrar no incinerador">