Nos demais casos, esse bloqueio de bens foi mantido, para aguardar o desfecho das ações no novo juízo que cuidará dos processos. E é nesse ponto que se dá o imbróglio. 1g6p5x
Quanto mais tempo o juiz demora para reavaliar o processo e decidir, maior é a chance de prescrição, quando o Estado perde o direito de punir um réu pela agem do tempo. E nessa hipótese, a restituição dos bens ao réu se impõe. Mas, para evitar que o juiz convalide os atos do magistrado declarado incompetente, defesas dos réus têm alegado que todos eles devem ser anulados.
É o que diz o advogado Marcelo Leal, defensor de Henrique Eduardo Alves. Ele entende que todo o processo de um réu deve ser anulado quando o juiz que o instruiu é declarado incompetente. “A consequência lógica é anulação, porque a regra é anular atos decisórios. Vai ter uma discussão sobre quais atos”, diz.
Se todos os atos do juiz incompetente forem anulados, isso incluirá não só a sentença condenatória, mas também o recebimento da denúncia. Os dois atos são marcos interruptivos do prazo de prescrição. Quando eles são anulados, o prazo a a contar desde a data do fato pelo qual o réu foi acusado. A anulação desses dois atos do processo, portanto, torna mais fácil a prescrição, a extinção da punibilidade e, assim, a devolução dos valores para os réus.
É o que sustenta o advogado Aury Lopes Jr., que defendeu Eduardo Cunha no processo da Caixa. Ele cita o artigo 117 do Código de Processo Penal, que diz que “o sequestro será levantado se for julgada extinta a punibilidade”. “Pode ocorrer a prescrição? Pode. É o preço a ser pago pela incompetência deles e má-fé deles em manipular a competência”, diz.
Para alguns procuradores, no entanto, é possível ao Ministério Público tentar reter os bens de um réu em outra ação, de natureza cível, de ressarcimento ao Estado. É o que pensa o procurador de Justiça e professor de direito penal Rodrigo Chemin, do MP do Paraná. Ele cita o artigo 37, parágrafo 5.º, da Constituição Federal, que diz que esse tipo de ação não prescreve, quando se constata o dano aos cofres públicos num crime contra a istração pública.
Chemin afirma, no entanto, que para isso seria necessário que os tribunais criassem uma jurisprudência para assegurar esse pagamento. “O problema maior é o elevadíssimo grau de discricionariedade. É impressionante como oscila a interpretação, gerando insegurança jurídica enorme. Sempre se acha brecha para nova interpretação”, diz.
O procurador regional da República Bruno Calabrich, que já atuou no grupo de trabalho da Lava Jato na Procuradoria Geral da República (PGR), ressalva, porém, que não cabe apresentar uma ação do tipo no caso de desvios da Petrobras – por ser uma sociedade de capital misto, seu patrimônio não é do erário. “Há grande chance de não existirem instrumentos para reaver o dinheiro desviado”, diz.
Ele também critica as decisões do STF que retiraram os casos da Justiça Federal e os transferiram para a Justiça Eleitoral, especialmente porque, em anos anteriores, foi o próprio STF que havia remetido esses processos para uma vara federal, quando políticos réus perderam o foro privilegiado, ao encerrarem mandatos.
“Não foi o Marcelo Bretas [da 7.ª Vara Federal do Rio], nem o Vallisney Oliveira [10.ª Vara Federal de Brasília] que decidiu isso. Minha surpresa é gente querer imputar isso ao juiz ou ao promotor que recebeu o caso do próprio STF”, afirma Calabrich.
Já em relação a condenados que confessaram seus crimes em delações premiadas, a devolução de bens é considerada mais difícil. Isso porque os pagamentos que fizeram decorrem dos acordos de colaboração, que ficam intactos se uma condenação é anulada por motivos processuais, como é o caso da competência do juízo.
“O delator tem um contrato, um compromisso em colaborar com a acusação. Eventualmente, se uma sentença condenatória é anulada e alcança um delator, ok, anulou a sentença. Não está anulada a delação. Se eles pagaram algo, isso decorreu não da sentença, mas do acordo. Enquanto o acordo não for anulado, isso está valendo”, diz Aury Lopes Jr.
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