Embora o número de mortes nos campos de concentração supere muitas vezes o número de vítimas das bombas atômicas, todo ano, nas duas primeiras semanas de agosto, esse último evento é lembrado em todo o mundo e é motivo de cerimoniais em memória das vítimas e como alerta sobre a capacidade de destruição de uma guerra nuclear.

Existem algumas estimativas do total da energia liberada por todos os explosivos utilizados na II Guerra Mundial. Uma delas foi feita por dois físicos, o norte americano Richard L. Garwin (1928-), designer responsável por uma das mais potentes armas termonucleares construída pelos EUA, a Ive Mike, de 10,5 megatons, onde 1 megaton (Mt) é igual a 1000 quilotons (kt). A bomba atômica de Hiroxima tinha poder explosivo de 13,5 kt, portanto, a Ive Mike era 780 vezes mais potente. O outro físico foi o russo Andrei Sakharov (1921-1989), designer das armas termonucleares soviéticas. A avaliação dos dois é de 3,0 Mt. Desses, 2,1 Mt foram utilizados pelos EUA e 0,9 Mt pelos demais países. Da parcela dos EUA, 1,4 Mt foram destinados à Alemanha e 0,7 Mt ao Japão. Se somarmos a energia liberada nas duas bombas atômicas lançadas sobre o Japão, a Little Boy de 13,5 kt (Hiroxima) e a Fat Man de 21 kt (Nagasáqui), obtém-se 0,0345 Mt, ou seja, “apenas” 1,15% de toda a energia dos explosivos da II Guerra Mundial e “somente” 4,93% de toda a energia dos explosivos lançados sobre o Japão, pelos EUA. Contabilizados nos 95,1% dos ataques norte-americanos ao Japão, está a cidade de Tóquio que sofreu com vários bombardeios aéreos, sendo um deles o mais arrasador e realizado em dois dias de março de 1945, quand cem mil japoneses perderam a vida.

Por que então só lembramos das bombas atômicas sobre Hiroxima e Nagasáqui? Por algumas razões, dentre elas: pelo enorme poder de destruição de uma única explosão dessa natureza, pelo fato de que existem milhares destes artefatos pertencentes a nove países, e porque nenhuma arma ou estratégia militar é capaz de gerar tantas mortes em tão curto intervalo de tempo. Nenhuma guerra convencional, por mais abrangente que fosse, e mesmo que utilizasse armamentos poderosos e sofisticados, teria como consequência o extermínio da vida na Terra. Uma guerra nuclear, mesmo que somente entre duas grandes potências nucleares, teria.

Portanto, ao relativizarmos os ataques nucleares às cidades de Hiroxima e Nagasáqui, quando contrapostos ao prolongamento do conflito EUA x Japão, aceitamos com indulgência que o uso de uma arma de destruição em massa poderia, em certas circunstâncias, dizimar uma cidade e seus cidadãos em segundos. Baseado numa média de vários relatórios sobre o tema, ocorreram aproximadamente 60 mil mortes instantâneas nas duas cidades japonesas, com 70% dos edifícios destruídos em Hiroxima e 40% em Nagasáqui. O adjetivo plural “instantâneas” sugere poucos segundos após a explosão.

Não é possível relativizar esses eventos. É uma atitude de compaixão, portanto, todos os anos, no mês de agosto, lembrarmos de Hiroxima e Nagasáqui como alvos de uma missão militar que jamais deveria ter sido planejada nem cumprida, como forma de homenagem às vítimas fatais, aos feridos e aos familiares sobreviventes. E ainda, execrarmos qualquer hipótese de uso de uma arma desta natureza num conflito bélico.

Dinis Gomes Traghetta é professor do Departamento de Física da UTFPR – Medianeira, palestrante e autor do livro “A Bomba Atômica Revelada”.

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