Ora, nas sinuosas fronteiras institucionais do poder, a forma jurídica não tem o condão de desnaturar o fato em si. Não se questiona que o Supremo pode muito, mas o muito não é tudo. Sentenças judiciais podem até amenizar, mas jamais resolverão a natureza de problemas políticos autênticos. Por maior que o seja o talento hermenêutico do julgador, a crueza da política exige limites semânticos que vão além da norma posta, extravasando as margens de construção judicial do possível. Logo, está chegada a hora do STF sopesar suas extraordinárias técnicas de jurisdição constitucional, reduzindo suas margens de influência e seus flancos de exposição.

A hora exige comedimento e coragem para expor com clareza os deveres e responsabilidades de cada poder no seio da República. Definitivamente, não cabe à alta corte assumir encargos que não são seus.

Vivemos um tempo de transparência radical sobre as questões do Estado, inexistindo espaço para os velhos métodos de complacência velada com os malfeitos do poder. A sociedade democrática exige um sistema ético do poder, que tenha na lei um instrumento de justiça prática e, não, de impune proteção dos poderosos. Como bem aponta o nobre magistério de Gustavo Zagrebelsky, “a justiça constitucional é uma função republicana”. E a República, para ser séria, próspera e estável, há de respeitar o povo e, não, tratá-lo como tolo. A democracia atual, em sua dinâmica sociedade em redes, é instantaneamente reativa à malversação dos assuntos públicos. Portanto, a política e as instituições republicanas estão cercadas por um sem precedente estado cívico de sítio. Para onde vamos ainda não é possível dizer, mas o civismo constitucional ativo é uma nova força que veio para ficar.

Sebastião Ventura Pereira da Paixão Jr. é advogado e conselheiro do Instituto Millenium.

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